O cultivo de cannabis envolve a escolha de uma genética adequada que atenda às condições de cultivo e aos objetivos específicos do cultivador. As variedades de cannabis são geralmente divididas em três tipos principais: Indica, Sativa e Ruderalis. Cada uma possui características próprias, como estrutura, composição de canabinoides e necessidades de cultivo. A compreensão dessas diferenças ajuda a otimizar o cultivo, adequando-o a objetivos terapêuticos e condições climáticas específicas (Clarke & Merlin, 2013). Desta forma, vamos explorar as diferenças morfológicas e fitoquímicas dos diferentes tipos de cannabis e nortear seu cultivo.
1. Cannabis Indica
A Cannabis Indica é originária das regiões montanhosas da Ásia, incluindo o Afeganistão, o Paquistão e partes da Índia. Ela é caracterizada por seu crescimento compacto, folhas largas e tempo de floração rápido, sendo uma escolha popular para o cultivo indoor devido ao seu porte baixo (Schultes et al., 1974).
A Cannabis Indica é resistente a baixas temperaturas e a variações de umidade, o que a torna adaptável a diferentes ambientes de cultivo (Friedman et al., 2021). Suas características robustas e de floração rápida a tornam uma boa opção para cultivadores que buscam rendimentos consistentes em um curto espaço de tempo.
Indicas tendem a ter um efeito relaxante e sedativo, o que as torna ideais para o tratamento de condições como insônia, dor crônica e ansiedade (Russo & Marcu, 2017). Com seu perfil de canabinoides mais equilibrado, com destaque para o CBD, elas são amplamente utilizadas em tratamentos médicos. Entre as espécies de Indica mais conhecidas, destacam-se:
Afghan Kush
Variedade rica em CBD e com efeitos profundamente relaxantes, bastante usada para o alívio de dor e estresse.
Northern Lights
Conhecida pelo seu crescimento rápido e efeitos sedativos, muito cultivada em ambientes internos e utilizada para tratamento de insônia e dores musculares.
Hindu Kush
Variedade com perfil de terpenos que reforça o efeito calmante, ideal para relaxamento e controle de ansiedade.
2. Cannabis Sativa
A Cannabis Sativa é originária de regiões tropicais como América Central, Sudeste Asiático e partes da África. Ela possui um porte alto, com folhas finas e alongadas, sendo uma planta que exige maior espaço e mais tempo para florescer. A Sativa é valorizada por seu efeito estimulante e eufórico, útil para o tratamento de condições como depressão, fadiga e perda de apetite (Small & Cronquist, 1976).
As Sativas são conhecidas por sua alta concentração de THC, o que as torna populares para uso recreativo, embora também tenham potencial medicinal para tratar condições que requerem aumento de energia e bom humor (Clarke & Merlin, 2013).
O cultivo de Sativas requer atenção especial à altura da planta e ao período de floração, que é geralmente mais longo. Elas preferem climas quentes e ensolarados, sendo mais adequadas para cultivo outdoor em regiões com maior exposição solar. Entre as espécies de Sativa mais conhecidas estão:
Durban Poison
Uma variedade originária da África do Sul, famosa por seu efeito energético e aumento de foco, sendo ideal para uso diurno.
Jack Herer
Conhecida por seu efeito cerebral e estimulante, utilizada para aumentar a criatividade e aliviar o estresse.
Lemon Haze
Apresenta notas cítricas marcantes e um efeito animador, comumente usada para combater a depressão e a fadiga.
3. Cannabis Ruderalis
A Cannabis Ruderalis é uma variedade pouco conhecida, originária de regiões de clima extremo, como a Rússia e o norte da Ásia. A Ruderalis é única por sua capacidade de autofloração, ou seja, ela entra na fase de floração de acordo com sua idade, e não com o ciclo de luz. Essa característica torna a Ruderalis ideal para cruzamentos com outras variedades, resultando em híbridos autoflorescentes (Small & Cronquist, 1976).
A Ruderalis é especialmente vantajosa para regiões com baixa exposição à luz solar, permitindo colheitas mais rápidas e eficientes. Essa variedade é amplamente utilizada para o desenvolvimento de cultivares resistentes e de baixo custo para o cultivo medicinal (McPartland & Guy, 2017). Apresenta porte pequeno e baixas concentrações de THC e CBD, torna-se uma escolha interessante para tratamentos que exigem pouca ou nenhuma psicoatividade. Entre as espécies de Ruderalis conhecidas, podemos citar:
Lowryder
Uma das primeiras variedades comerciais de Ruderalis, conhecida por sua floração rápida e baixo porte, sendo ideal para cultivos discretos.
Diesel Ryder
Variante da Lowryder cruzada com a famosa NYC Diesel, que apresenta um leve efeito estimulante com uma floração curta.
Fast Bud
Híbrido que combina a floração rápida da Ruderalis com outras genéticas mais potentes, adequada para cultivadores que buscam colheitas rápidas e consistentes.
Aspectos Terapêuticos e de Cultivo
A escolha da genética é influenciada por fatores como o clima, o espaço disponível para cultivo e os objetivos terapêuticos. Em cultivos medicinais, por exemplo, é importante considerar a composição de canabinoides e o perfil de terpenos.
A Indica é uma boa opção para tratar dores e insônia devido ao seu efeito relaxante e teores elevados de CBD. Do outro lado, a Sativa, com seus efeitos energéticos e estimulantes, é mais adequada para aliviar sintomas de depressão e falta de apetite.
A Ruderalis, embora tenha baixa concentração de THC, se destaca pela adaptabilidade, sendo uma excelente escolha para cruzamentos genéticos que geram híbridos de floração automática, atendendo assim a locais com ciclos de luz desfavoráveis (McPartland & Russo, 2001).
Conclusão
O conhecimento sobre as principais variedades de cannabis e suas características específicas ajuda os cultivadores a escolherem a genética que melhor se adapta ao ambiente de cultivo e ao objetivo desejado. A escolha entre Indica, Sativa e Ruderalis é um fator determinante para o sucesso do cultivo e para o alcance dos efeitos terapêuticos. Em um contexto de expansão do uso medicinal, a compreensão das diferenças entre essas variedades permite otimizar o cultivo, aumentando a eficiência e o potencial de aplicação para o tratamento de diferentes condições de saúde. Mas claro, sem perder de vista os aspectos legais atrelados ao cultivo.
Referências
CLARKE, Robert C.; MERLIN, Mark D. Cannabis: evolution and ethnobotany. Berkeley: University of California Press, 2013. ISBN 978-0520270480.
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